A revolução rebolativa de Eron Villar e DJ Vibra
Colaboração do ator Eron Villar e da DJ Vibra, “Se eu fosse Malcolm?” não chega a ser o que se anuncia, embora acabe por se configurar como uma experiência muito poderosa. O Malcolm do título do espetáculo faz menção a Malcolm X, militante norte-americano que atuou na década de 1960 pelos direitos civis dos negros. A interrogação ali presente também merece atenção, não é meramente retórica. Eron Villar, que assina a dramaturgia, se faz, literalmente, esse questionamento. Alguém com as ideias de Malcolm X, deslocado 60 anos no tempo, falaria a quem? Um Malcolm X do século XXI seria mais forte, encontraria mais eco para suas teses? O fato é que “Se eu fosse Malcolm?” não se fixa numa referência tão particular assim.
Aparentemente, um tanto obcecados pela biografia singular de Malcolm X, Eron Villar e DJ Vibra cruzam trajetórias reluzentes de outras personalidades negras. Malcolm X, assim, perde espaço para nomes como os ativistas Bayard Rustin e Martin Luther King Jr., o lutador de boxe Muhammad Ali, a diva Nina Simone e até mesmo ícones brasileiros, como Zumbi, o rei dos Palmares, e a cantora Elza Soares. Isso, para ficar nas figuras públicas que assumiram uma projeção mais regular no correr da história. “Se eu fosse Malcolm?”, entretanto, é entrecortado por citações de dor e de luta, de certo modo, anônimas. É o caso, por exemplo, de George Floyd e seu “I can’t breathe”, também lembrados em cena por Eron Villar e DJ Vibra.
“Se eu fosse Malcolm?” não tem a literalidade que provoca e só se afirma na medida que se dilata. “Se eu fosse Malcolm?” não fala de X, fala de um alfabeto inteiro de enfrentamento ao racismo, em suas diversas formas de apresentação. A montagem imagina ter um foco muito definido, quando, na verdade, o que funciona mais claramente no contato com o público é a articulação inteligente e ágil de tantos temas e tantos tipos e tantos tempos e tantos lugares. Talvez, todos sejam um tanto Malcolm X, mas essa também não é a questão. “Se eu fosse Malcolm?” não trata, ao fim, de um lutador, trata de uma luta, que tem sido de muitos, é verdade, e deveria ser de todos, mais verdade ainda.
Muito bem resolvido na plasticidade de sua composição, combinando, com equilíbrio e muita beleza, recursos de iluminação com projeções de vídeo e trechos musicados, “Se eu fosse Malcolm?” se perde, entretanto, ao se assentar indevidamente numa estrutura de solo. Assim como o ponto central de atenção não está em Malcolm X quando se observa em detalhe a dramaturgia, o ponto central de atenção não está em Eron Villar quando se observa em detalhe a encenação. Muito embora Malcolm X acione os questionamentos que conduzem a narrativa e Eron Villar funcione como um núcleo irradiador de todo processo, inclusive interpretando o ativista, “Se eu fosse Malcolm?” seria outro sem a presença definitiva da DJ Vibra.
Em cena, DJ Vibra não tem uma atuação acessória. Ela está lá como DJ, sim, mas assume funções cruciais para organizar o discurso da peça. É DJ Vibra., por exemplo, quem interrompe as elocubrações de Malcolm para localizar o racismo no Brasil com outras violências que não as vividas pelas comunidades negras nos EUA. É DJ Vibra, ainda, quem conclama a plateia para uma revolução rebolativa, subvertendo o que é da ordem do clichê e do estereótipo em potência transformadora. “Se eu fosse Malcolm?” encontra em DJ Vibra uma força física que merece mais destaque. “Se eu fosse Malcolm?” tem um caminho virtuoso a ser explorado naquilo que tem de base coreografada. “Se eu fosse Malcolm?” pode e deve ser mais dançado, mais livre.
Com cerca de 60 minutos de duração, o espetáculo tem um ritmo dinâmico de esquete e um trato com o público muito intenso. Por diversas vezes, Eron Villar e DJ Vibra interagem com os espectadores como que a querer arregimentar novas vozes para fazer coro as suas ideias. E conseguem. A resposta é muito bonita, viva, interessada. “Se eu fosse Malcolm?” tem uma conexão muito forte com o hoje, com as demandas desse tempo presente e com as formas de criação cênica desse tempo presente. É uma montagem que faz dialogar linguagens, enquanto provoca convenções, inclusive sociais. Ainda com uma história muito recente nos palcos, tendo estreado em maio de 2023, “Se eu fosse Malcolm?” tem ajustes a fazer, sem dúvidas, mas tem, também, um caminho muito vasto pela frente. Nina Simone e Elza Soares ainda vão tocar muito!
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03/06/2024 @ 08:46
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03/06/2024 @ 23:07
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29/06/2024 @ 09:03
Muito obrigado por esse post tão informativo e bem elaborado. Foi muito útil!
Amzx.art
06/10/2024 @ 12:37
Concordo com os pontos abordados.
NFC e RFID Restaurante
06/10/2024 @ 13:34
Acredito que textos como este são essenciais para ampliar a discussão sobre temas tão relevantes e pouco abordados.